Biometano: conquistando espaço na agenda de transição energética 

Fonte: Reprodução da internet

O setor de biogás e biometano entende que passou à margem do projeto de lei do Combustível do Futuro, apresentado pelo governo federal em setembro. Agentes desse mercado ainda incipiente, mas promissor, se articulam agora para conquistar espaço na agenda de transição energética liderada pelo Planalto. Por meio da Associação Brasileira do Biogás (Abiogás), costura uma emenda, a ser apresentada na tramitação do PL do Combustível do Futuro, para criar um Programa Nacional de Biometano.

Procurada pela gas week, a Abiogás não se pronunciou sobre o tema.

Em paralelo, o setor se prepara para outras frentes, dentre elas a discussão nos fóruns do Gás para Empregar e a tentativa de aproximação com os governos estaduais.

Um primeiro movimento, nesse sentido, já foi feito em São Paulo, mas o plano é levar a agenda setorial para os demais estados. O mercado de biometano vive um momento transformacional, com a chegada de novos investidores, interessados em se posicionar no tabuleiro. A lista inclui peixes-grandes como a CosanVibra e Energisa. Junto com a entrada dos novos agentes, o setor se debruça sobre a revisão de sua agenda. A gas week desta semana apresenta algumas das propostas que o setor tenta emplacar na política energética do país.

O conteúdo da emenda do PL Combustível do Futuro ainda não está fechado, mas uma das ideias que ganha força dentro das discussões internas é a proposta de um mandato para o biometano – experiência já consolidada com o biodiesel e etanol anidro e que, agora, vem sendo discutida (e reformulada) para o diesel verde (HVO) e combustível sustentável de aviação (mandato por redução de emissões).

Programa Nacional de Biometano viria acompanhado, assim, de uma obrigação de mistura de uma quantidade mínima do gás renovável — inicialmente de 1% da totalidade de gás comercializado, mas com uma curva crescente até 10% do volume, a ser estabelecida pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE).

A estratégia é obrigar quem fornece o gás (seja nacional ou importado) a cumprir o mandato, e não a distribuidora de gás canalizado ou transportador. A escolha foi por não pressionar as tarifas dos gasodutos e, assim, encontrar menos resistências à proposta.

Na visão de agentes do mercado de biometano, onerar as distribuidoras, por exemplo, é mais complexo e burocrático: está sujeito à abertura de janelas de revisão tarifária e às discussões sobre o impacto sobre a modicidade em cada estado, por exemplo…

Um mandato de 1% significa, dentro dos volumes de oferta de gás no país, hoje, algo em torno de 570 mil m³/dia – o que significa 2,85 vezes mais que a produção de biometano atualmente comercializada no mercado brasileiro.

Um lembrete: criar um plano nacional para o biogás e biometano é uma ideia discutida no Congresso Nacional há anos, sem avançar. A fonte poderia se beneficiar – mas não encontrou amparo político – de âncoras no mercado de transporte (os ‘corredores verdes’) e elétrico (os contratos de longo prazo dos leilões de energia). O setor, no entanto, vem conquistando algum espaço nas políticas energéticas, com o Renovabio (2018) e o Reidi (2022).

A agenda setorial é muito mais ampla que a ideia do mandato. De acordo com fontes, o debate sobre a proposta do Programa Nacional do Biometano passa, ainda, por questões como:

  • reconhecimento da importância do biometano para cumprimento de compromissos internacionais de descarbonização, sobretudo na indústria, transporte e agropecuária.

No agro, o objetivo é incluir de vez o biometano na cadeia de produção do etanol e proteína animal e impactar na pegada de carbono das exportações brasileiras (a Abiogás busca, aliás, aproximação com a bancada do etanol);

  • reconhecimento de que a metodologia de análise do ciclo de vida (ACV) precisa olhar de forma mais ampla que a proposta atual.

O Combustível do Futuro consolida a adoção da análise de ciclo de vida (ACV) do poço à roda. A Abiogás entende que a abrangência deve ir além da produção e consumo dos combustíveis e energia, incluindo o descarte (das baterias, por exemplo). Adotar outra metodologia seria uma chance de reconhecer atributos adicionais – o setor entende que o biometano leva vantagem por aproveitar resíduos.

O GARGALO DA INJEÇÃO NA REDE
Uma das dificuldades identificadas pelo setor está na injeção do biometano na malha de gasodutos – tanto das distribuidoras quanto das transportadoras.

“Hoje é complicado acessar a rede de dutos. A tarifa é cara, o investimento para conexão é caro, a revisão tarifária das distribuidoras é quinquenal. Imagina esperar cinco anos para calcular o impacto de um gasoduto para conectar uma planta de biometano? Deveríamos ter uma estrutura mais simplificada para biometano”, defende Maurício Carvalho, diretor executivo do Grupo Urca Energia, dono da Gás Verde.

Por isso, um dos pleitos da Abiogás é a flexibilização dos ciclos tarifários das distribuidoras estaduais de gás canalizado.

Um dos pleitos da associação junto ao governo de SP é a possibilidade regulatória de troca de um projeto pré-aprovado num ciclo tarifário pela Arsesp por um novo projeto, de custo aproximado, desde que sigam critérios objetivos, como modicidade tarifária.

Assim, não haveria necessidade de se esperar a janela de um novo ciclo tarifário se abrir para só então viabilizar um novo projeto de injeção na rede.

Em nota, a Arsesp afirmou que a regulação em São Paulo vem sendo, constantemente, aprimorada e tem permitido a inclusão de investimentos, a qualquer tempo “independentemente do plano de investimentos considerado nas Revisões Tarifárias Ordinárias das Concessionárias, desde que estes investimentos tenham, após avaliação técnica da Arsesp, comprovadas a sua prudência, viabilidade técnica e econômica, e modicidade tarifária”. Veja a íntegra da nota no fim desta newsletter.

A Abiogás também defende, dentre outras medidas relacionadas à infraestrutura:

  • fomento e incentivos fiscais para criação de interconexão de diferentes produtores em clusters (hubs), para dar ganho de escala para viabilizar soluções de escoamento da produção no interior, em regiões sem acesso aos sistemas de distribuição e transporte;
  • implementação de corredores de abastecimento, para criação de demanda por meio da substituição de diesel em veículos pesados;
  • aprimoramento das regras para o swap (troca) comercial e operacional de biometano entre as diferentes áreas de concessão de SP.

ACESSO A CAPITAL: BEM-VINDOS TÍTULOS VERDES 
O setor aguarda também, com expectativa, novidades sobre o plano do governo Lula de emitir títulos soberanos sustentáveis – que abrem caminhos para financiar a eletrificação do transporte público e diferentes etapas da cadeia do biometano.

Pelos critérios apresentados, os títulos cobrem diversos elos da cadeia do biogás e biometano, dos aterros (instalação e manutenção de sistemas de captura) até a produção do biometano em si.

A política faz parte da reforma dos aspectos financeiros da transição ecológica, tocada pela equipe econômica. Nesse caso, da dívida soberana, precisam ser despesas aprovadas no orçamento federal, mas de acordo com as regras apresentadas pela Fazenda, podem englobar subsídios e financiamento.

O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, acredita que a partir desta semana o governo estará pronto para emitir os títulos soberanos sustentáveis no mercado externo. A  data exata vai depender da janela de oportunidade.

Na visão de Maurício Carvalho, da Gás Verde, a iniciativa vai na direção correta – ainda que falte clareza sobre como as emissões serão operacionalizadas, na prática.

“Na posição de um desenvolvedor de projeto, uma das coisas que mais está machuca hoje esse mercado é o acesso a capital. A taxa de juros começou a apresentar curva de queda mas ainda é insustentável. E aí precisamos que o governo encontre formas de nos oferecer capital com custo mais barato”, comentou.

O importante, segundo ele, é que haja diversidade de agentes financeiros responsáveis pelo fundo – como funciona, hoje, o Fundo da Marinha Mercante (FMM).

O CEO da ZEG Biogás, Eduardo Acquaviva, acredita que os fundos poderão ajudar a destravar políticas para os corredores de abastecimento. Ele defende que os recursos sejam usados também para complementar garantias em operações de crédito, com o objetivo de facilitar a obtenção de financiamentos.

“Isso poderia agilizar processo com bancos privados”, disse.

A agenda da Abiogás, no entanto, passa por outros pontos no quesito acesso a capital, como mais financiamento público e, de forma indireta, incentivos fiscais.

Na esfera federal, segundo Maurício Carvalho, uma saída seria permitir que os recursos da cláusula de investimento obrigatório das petroleiras em pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I), nos contratos de produção de óleo e gás, sejam destinados ao setor de biometano.

OLHAR SOBRE A DEMANDA 
A indústria do biometano defende também medidas para facilitar a construção de demanda para o biometano. O setor prega, dentre outras coisas:

  • isenção/redução de ICMS para produtos que usem biometano como insumo ou fonte de energia; e para investimento em compressores nos postos de gasolina e nas garagens das transportadoras;
  • chamadas públicas específicas das distribuidoras para projetos de biometano;
  • isenção de IPVA e diferimento na cobrança de pedágio para veículos pesados movidos a GNV e biometano

“Além disso, a indústria que descarboniza, de fato, com troca de combustível, deveria ter melhor tratamento fiscal do que empresa que só compra crédito de carbono ou sequer descarboniza. Deveria ter ISS verde, ICMS verde…”, defende Carvalho.

A Abiogás defende, ainda, a criação de uma Central de Registros e Transações de Certificados de origem do Biogás e do biometano. O objetivo é garantir rastreabilidade, transparência, fungibilidade internacional e credibilidade aos certificados. Hoje, cada fornecedor trabalha com um certificado próprio.

Fonte: EPBR
Nélio Wanderley

Nélio Wanderley

CEO da Posto Seguro Brasil e sócio da Nortear Energy empresas de Consultoria e de Assessoria ao mercado de combustíveis Graduado em Administração e Gestão Comercial, Pós-graduado em Marketing, Pós-graduando em Gestão Pessoas e Comportamento Organizacional. Experiência profissional de mais de 30 anos na área Comercial, Gestão de Novos negócios (desenvolvimento de carteiras nas Distribuidoras de Petróleo), Gestão de Projetos, Gestão de Lubrificantes e Gestão de Rede de Postos, com carreira desenvolvida em empresas como: ATLANTIC, IPIRANGA e ALESAT.

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